É bonito xingar?
Outro dia vi um vídeo de uma
bebezinha linda que mal sabia falar circulando na rede. Alguém a indagava o que
ela seria quando crescesse. Ela inocentemente respondia: “puta”. A pessoa que
estava filmando dizia: não, você vai ser doutora! E de novo repetia a pergunta,
e a menininha proferia a mesma resposta. Assim o diálogo continuou por mais
alguns segundos até terminar com a criança dizendo: “doutora...puta”.
Parece que algum integrante da
família dessa criaturinha achou bonito e incentivou a sua performance diante do
vídeo. Confesso que eu achei engraçadinho. Entretanto, se fosse minha filha e
se eu soubesse que essa brincadeira estivesse sendo feita com ela, acho que eu
não permitiria.
Xingar,
falar palavrões, tratar os outros mal para algumas pessoas é normal porque
reproduzem aquilo que ouvem, aquilo que veem, aquilo que lhes é ensinado. A
violência doméstica é maior prova disso. Existem mulheres que são vítimas desse
tipo de agressão, contudo quando vão depor em juízo, só fazem elogiar os
autores desses crimes, contrariando tudo o que haviam dito na delegacia de
polícia.
“_ Ele
nunca me agrediu. Ele só me xinga e fala que vai me matar quando está com raiva
ou quando bebe._” Esta é uma das frases que mais ouvimos na sala de audiências
da vara de violência doméstica e familiar.
Invariavelmente os filhos e filhas
desse casal assistem a essas cenas, crescem nesse ambiente de hostilidade, de
desrespeito e desamor. Depois viram adultos. Esses adultos vão estar atrás do
volante de um carro, pilotando uma moto, numa sala de aula, nos atendendo em
alguma repartição pública, numa mesa de um bar, num estádio de futebol.
Porque
será que o funk proibidão (aquele com letras chulas e que ataca a polícia) faz
tanto sucesso? O artista MV Bill, afirma que o proibidão apenas retrata a
realidade violenta das favelas do Rio de Janeiro.
Considerando
o funk como uma manifestação cultural e adotando a linha de pensamento do
rapper, então, poderíamos deduzir que no momento em que exprimimos em coro um
palavrão contra um chefe de Estado num evento público e internacional, estamos
retratando uma realidade violenta de um País ou nos manifestando culturalmente?
Nenhum
nem outro, estamos praticando injúria, artigo 140 do Código Penal. Se a injúria
é direcionada a uma autoridade, enquadra-se no crime de desacato. Todos e todas
que ofenderam a dignidade e o decoro da Presidente são criminosos (as), pois,
praticaram fato típico e antijurídico. Não houve circunstância atenuante,
porque apesar dos (as) torcedores (as) estarem sob a influência de multidão,
esta não estava em tumulto. Contra a FIFA não houve crime pelo simples fato de
tal entidade não ter dignidade e decoro (atributos exclusivos de pessoa
física).
Por
dever de ofício defendo pessoas. No meu cotidiano quando atendo alguém que
tenha praticado crime, sempre busco saber o motivo e as circunstâncias do fato
para exercer minha função. Se a Defensoria tivesse que defender uma dessas
pessoas que cometeu injúria teria uma série de argumentos para fazê-lo, mas os nossos
serviços são para pobres e não para quem tem poder aquisitivo para adquirir
ingressos ao preço que foram vendidos.
Como
cidadã e como mulher, a meu ver, o xingamento contra a Presidente naquela
ocasião foi totalmente inapropriado e só demonstrou o grau da nossa educação
(assunto do qual a maioria dos eleitores vive reclamando).
Tânia Regina de Matos
Defensora Pública em Várzea Grande
Comentários